segunda-feira, 18 de março de 2013

A arte do momento e a dança dos sonhos


Por Tieta Macau
Um “caldeirão” de misturas, linguagens, imagens e informações. Mesmo que não apareça na cena é vivido na construção da obra. Texto, figurino, pausas, imprevistos, erros, todos propostos ou surgidos num caminho de um trabalho contemporâneo, são obstáculos e cada obstáculo é um enigma a ser desvendado que “no teatro, não se resolvem com as palavras, mas com a ação.” (BARBA,2010). A ação é fruto do corpo, e este é elemento chave para a arte contemporânea, é uma linguagem mesclando-se a outra linguagem:
Ele(o corpo) transmite gradações de significados expressivos numa comunicação não-verbal, indo desde os gesto cotidianos até os extracotidianos, em sua manifestação poética. Ou seja, com vistas a uma finalidade artística. (SILVA, 2010, pg. 53)

Teatro é comunicação e o corpo é instrumento dessa comunicação. O movimento é elemento presente e indispensável a dramaturgia contemporânea, o corpo constrói aspectos dramatúrgicos às frases de movimentos, segundo SILVA essas podem ser definidas como um conjunto orgânico de gestos que comunicam uma ação corporal estruturada com inicio meio e fim. (2010, p. 57). A ação é a dramaturgia do corpo no espaço e no tempo e é quem é responsável por construir em grande parte o diálogo na cena contemporânea. Mesmo contendo textos teatrais, poéticos, contos, músicas e etc., estes estão quase sempre dialogando e se relacionando às ações corporais. O teatro contemporâneo é constituído de corpo, movimento, pensamento, sensações, a biografia do individuo – pois o processo de vida independente do individuo também soma à obra.  Para Lehmann o o conceito de escritura cênica deve:
Deslocar o foco para os procedimentos propriamente teatrais: a qualidade da presença, do gestual e do movimento dos atores, a semiótica dos corpos, as componentes estruturais e formais da língua enquanto campo de sonoridades, o desenvolvimento musical e rítmico do espetáculo, com sua temporalidade própria, e a iconografia dos procedimentos visuais, que, em lugar de ilustrar um texto compõe ”superfícies de linguagem antinômicas.”(FERNANDES, 2010, p. 53)

Penso que se o trabalho preciso com o corpo, ritmo e espaço está presente, há dança, e vejo o  teatro contemporâneo como uma dança que possui uma lupa para as pequenas ações denominadas de gestos, organizados em sequências, imagens e diálogos. A cena contemporânea é um espaço que preenche e esvazia com ações reais e coreografadas– e com situações que independem uma das outras, não se ligam pelo tempo, no entanto há um elo entre ambas, e o responsável por decifrar esse elo é o espectador.
Meu pensamento gira em torno do corpo, do movimento, mesmo com sono ou preguiça, ele move. Narrar no teatro contemporâneo, para mim é dançar. E se o tema é sonho, eu danço dormindo. A minha arte é regida pelo movimento. Em sala trabalhamos algumas visões acerca do teatro contemporâneo no Brasil e no mundo, e partimos para busca de elemento para a composição de nossos enigmas. O primeiro conto, o primeiro sonho:
Helena sonhou que queria fechar uma mala e não conseguiu, e fazia força com as duas mãos, e apoiava os joelhos sobre a mala, e não adiantava. A mala que não se deixava fechar transbordava coisas e mistérios.
(GALEANO, 2012)

Na fila dos sonhos, um sonho que se sonha só pode ser um sonho que se sonha junto. E logo virou:
Durante muito tempo tive medo de sonhar, do anoitecer do deitar. Um dia me disseram que o sonho era meu e nele poderia ser e fazer o que quisesse. A cada vez que fiquei com medo criei asas e voei para um lugar que não era casa e nem mundo... Voei para o alto, lá para o céu onde ninguém pudesse me alcançar ou ver. As vezes fui até uma pedra. Fui feliz. Chorei, chorava por medo, dor não sei! Havia lágrimas e risos. E o melhor é ver tudo se repetir, por toda a minha vida, lagrimas, risos, asas, dejavus premonições, surpresas... sonho. Só. Sonho. Descobri que no sonho poderia ser o que nunca poderia ser na Terra. Ser árvore princesa, barco de papel ou qualquer coisa que seja simplesmente de verdade. Eu.

A vida de Ismar, e seu tesouro no fundo de casa lhe dado através de um sonho, também entraram na dança para somar a construção. Corpo, sons, pessoas, elementos, palavras, contos e músicas e improvisações. Tudo foi jogado no “caldeirão” e todos chegaram a um resultado. Muitas coisas foram deixadas pra trás, no entanto “não há trabalho criativo sem desperdício.” (BARBA, 2010)
Sonhei só, sonhei junto. Do meu teatro, fiz minha dança... e contemporâneo para mim é a verdade do que a gente faz com o coletivo das ações, das linguagens, dos espações dos corpos. Ou simplesmente resumo a arte contemporânea em uma música:


REFERENCIAS BLIOGRÁFICAS
BARBA, Eugênio. Como queimar a casa: origens de um diretor. São Paulo: Perspectiva. 2010
FERNADES, Silvia. Teatralidades contemporâneas. São Paulo: Perspectiva. 2010.
SILVA, Soraia Maria. A linguagem do corpo. Humanidades nº52. UNB, 2006. PP 53 - 66.
COSTA, José. Teatro contemporâneo no Brasil – criações partilhadas e presença diferida. Rio de janeiro: 7 letras, 2009.

GALEANO, Eduardo. O livro dos abrações. 9ed.. Porto Alegre: L&PM. 2002.

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