Por Tieta Macau
Um “caldeirão” de misturas, linguagens, imagens e informações.
Mesmo que não apareça na cena é vivido na construção da obra. Texto, figurino,
pausas, imprevistos, erros, todos propostos ou surgidos num caminho de um
trabalho contemporâneo, são obstáculos e cada obstáculo é um enigma a ser
desvendado que “no teatro, não se resolvem com as palavras, mas com a ação.” (BARBA,2010).
A ação é fruto do corpo, e este é elemento chave para a arte contemporânea, é
uma linguagem mesclando-se a outra linguagem:
Ele(o corpo) transmite gradações de significados
expressivos numa comunicação não-verbal, indo desde os gesto cotidianos até os
extracotidianos, em sua manifestação poética. Ou seja, com vistas a uma
finalidade artística. (SILVA, 2010, pg. 53)
Teatro é comunicação e o corpo é instrumento dessa
comunicação. O movimento é elemento presente e indispensável a dramaturgia
contemporânea, o corpo constrói aspectos dramatúrgicos às frases de movimentos,
segundo SILVA essas podem ser definidas como um conjunto orgânico de gestos que
comunicam uma ação corporal estruturada com inicio meio e fim. (2010, p. 57). A
ação é a dramaturgia do corpo no espaço e no tempo e é quem é responsável por
construir em grande parte o diálogo na cena contemporânea. Mesmo contendo
textos teatrais, poéticos, contos, músicas e etc., estes estão quase sempre
dialogando e se relacionando às ações corporais. O teatro contemporâneo é
constituído de corpo, movimento, pensamento, sensações, a biografia do
individuo – pois o processo de vida independente do individuo também soma à
obra. Para Lehmann o o conceito de
escritura cênica deve:
Deslocar o foco para os procedimentos propriamente
teatrais: a qualidade da presença, do gestual e do movimento dos atores, a
semiótica dos corpos, as componentes estruturais e formais da língua enquanto
campo de sonoridades, o desenvolvimento musical e rítmico do espetáculo, com
sua temporalidade própria, e a iconografia dos procedimentos visuais, que, em
lugar de ilustrar um texto compõe ”superfícies de linguagem antinômicas.”(FERNANDES,
2010, p. 53)
Penso que se o trabalho preciso com o corpo, ritmo e espaço
está presente, há dança, e vejo o teatro
contemporâneo como uma dança que possui uma lupa para as pequenas ações
denominadas de gestos, organizados em sequências, imagens e diálogos. A cena
contemporânea é um espaço que preenche e esvazia com ações reais e
coreografadas– e com situações que independem uma das outras, não se ligam pelo
tempo, no entanto há um elo entre ambas, e o responsável por decifrar esse elo
é o espectador.
Meu pensamento gira em torno do corpo, do movimento, mesmo
com sono ou preguiça, ele move. Narrar no teatro contemporâneo, para mim é
dançar. E se o tema é sonho, eu danço dormindo. A minha arte é regida pelo
movimento. Em sala trabalhamos algumas visões acerca do teatro contemporâneo no
Brasil e no mundo, e partimos para busca de elemento para a composição de
nossos enigmas. O primeiro conto, o primeiro sonho:
Helena
sonhou que queria fechar uma mala e não conseguiu, e fazia força com as duas
mãos, e apoiava os joelhos sobre a mala, e não adiantava. A mala que não se
deixava fechar transbordava coisas e mistérios.
(GALEANO,
2012)
Na fila dos sonhos, um sonho que se sonha só pode ser um
sonho que se sonha junto. E logo virou:
Durante muito tempo tive medo de sonhar, do anoitecer do deitar. Um dia
me disseram que o sonho era meu e nele poderia ser e fazer o que quisesse. A
cada vez que fiquei com medo criei asas e voei para um lugar que não era casa e
nem mundo... Voei para o alto, lá para o céu onde ninguém pudesse me alcançar
ou ver. As vezes fui até uma pedra. Fui feliz. Chorei, chorava por medo, dor
não sei! Havia lágrimas e risos. E o melhor é ver tudo se repetir, por toda a
minha vida, lagrimas, risos, asas, dejavus premonições, surpresas... sonho. Só.
Sonho. Descobri que no sonho poderia ser o que nunca poderia ser na Terra. Ser árvore
princesa, barco de papel ou qualquer coisa que seja simplesmente de verdade.
Eu.
A vida de Ismar, e seu tesouro no fundo de casa lhe dado
através de um sonho, também entraram na dança para somar a construção. Corpo,
sons, pessoas, elementos, palavras, contos e músicas e improvisações. Tudo foi
jogado no “caldeirão” e todos chegaram a um resultado. Muitas coisas foram deixadas
pra trás, no entanto “não há trabalho criativo sem desperdício.” (BARBA, 2010)
Sonhei só, sonhei junto. Do meu teatro, fiz minha dança... e
contemporâneo para mim é a verdade do que a gente faz com o coletivo das ações,
das linguagens, dos espações dos corpos. Ou simplesmente resumo a arte contemporânea
em uma música:
REFERENCIAS BLIOGRÁFICAS
BARBA, Eugênio. Como
queimar a casa: origens de um diretor. São Paulo: Perspectiva. 2010
FERNADES, Silvia. Teatralidades contemporâneas. São Paulo: Perspectiva. 2010.
SILVA, Soraia Maria. A linguagem do corpo. Humanidades nº52. UNB, 2006. PP 53 - 66.
COSTA, José. Teatro
contemporâneo no Brasil – criações partilhadas e presença diferida. Rio de
janeiro: 7 letras, 2009.
GALEANO, Eduardo. O livro dos abrações. 9ed.. Porto Alegre: L&PM. 2002.
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