Poesia, apesar das arestas
Por Heidy Ataides
“Um símbolo é
um símbolo se aceito por dois interlocutores: o que transmite e o que recebe.”
BOAL, pag. 142.
Toda essa busca tem como
principal foco a transformação do espectador em ator. Onde todo o trabalho para
essa conversão, de espectador em ator, se subdivide em etapas que desde o
preparo do corpo às ações cênicas em si, são trabalhadas questões para o
despertar da consciência corporal desde o entendimento das possibilidades
quanto as deformações que o corpo sofre tal qual o trabalho que realiza e a
busca pela libertação da máscara social de comportamento.
“Se a pessoa
é capaz de “desmontar” suas próprias estruturas musculares, será certamente
capaz de “montar” estruturas musculares próprias de outras profissões e de
outros status sociais, estará mais capacitado para interpretar outros
personagens diferentes de si mesmo.” BOAL, pag. 146.
Mergulhando e experimentando a
prática de algumas técnicas de Boal em sala de aula, o Teatro - Imagem trouxe nos temas sociais da nossa realidade.
Para a transformação da imagem de real para imagem ideal e dessas para a imagem de trânsito, foi trabalhada a
imagem gerada a cerca do tema “cultura” onde em suma o que queremos é que a
partir da educação se reconheça o envolvimento de todas as artes e a
diversidade como a união e a coletividade entre os povos. A quebradeira de
coco, a população que brinca o boi, o escritor e o regueiro foram algumas das
figuras trazidas na diversidade e multiplicidade da cultura maranhense. A
discussão para chegarmos ao consenso, teve como fim que imagem ideal não
representava o discurso de igualdade que gostaríamos de transmitir, ficando
como ideal não a última imagem (a do abraço) mas sim os exemplos que a imagem
pôde representar de cultura (o regueiro, a quebradeira de coco, o escritor e o
brincante de boi).
O Teatro-imagem, colocado por
Boal como facilitador da construção da prática teatral em si, e a mais
estimulantes por ter a capacidade de tornar visível o pensamento como conotação
única para cada um em comparação com a linguagem idioma onde a palavra possui a
mesma denotação para todos e conclui “A imagem sintetiza a conotação individual
e a denotação coletiva.”
Com a discussão a cerca da “política”,
a discussão deu foco à descrença do povo maranhense, nos políticos e na
corrupção que assola todo o país. A imagem que chegamos a partir dos comandos
para a construção da mesma nos remete o político comprando a opinião pública ou
o voto, enquanto o olhar do eleitor que se deixou levar e confiar em promessas
feitas e descumpridas e ao perceber sentir-se lesado e impotente diante de um
protesto de indignação que não é ouvido, e por outro lado o outro que
miseravelmente clama por condições mínimas sociais e de sobrevivência, passivo
de se deixar levar quantas vezes for, em quantas eleições for o caso. Com a
mobilidade dessa imagem, ou seja, a representação cênica em si e com a inserção
de sons e um pequeno diálogo “Que merda,
fui enganado outra vez? Como pude me deixar levar e acreditar, como fui
cego...” Da experimentação enriquecedora com essa imagem, trabalhamos o Teatro - Debate, o público pôde
intervir na execução e modificação da cena, trazendo espectadores para o lugar
dos atores na representação dos gestos na repetição e ainda na alteração da
cena, procurando dar solução ao problema levantado em si. Para exemplificar o Teatro - Forum, foi aproveitada a mesma
imagem e a realização do jogo proposto por essa técnica, provocando o espectador
a sair da passividade, trazendo-o à cena, instigando-o à crítica e à
transformação. Do Teatro – jornal a
partir da leitura e recorte de notícias, de onde o trabalho para a construção
de cenas em grupo, trouxe ainda mais
clara a necessidade de compreensão e sensibilização a partir da exposição
social midiática, nem sempre verdadeira e nem sempre com o sentimento do
protagonista citado... afinal a maioria dos editoriais não tem essa preocupação
e mais uma vez, pra vida é necessário, poesia, música, rimas, independente de
quão trágica e de quantas arestas construímos ao longo dela pra melhor
passarmos pela missão por estas terras.
A encenação por representantes
sociais reais que perpassam por esses problemas são incitados a partir das
técnicas propostas por Boal a encontrarem soluções para o “problema” levantado
em cena, o problema que geralmente percorre a vida de quem o encena precisa ter
uma solução ou no mínimo a proposição da crítica do que ocorre, mudança de
posição, de pensamento, o ser humano sair da passividade à luta pela sua
própria libertação.
A busca de Boal pela criação de
um método que provocasse e sobretudo tivesse de investigativa a realidade das
pessoas, como sendo essa a cena e seu protagonista o próprio ser, me lembra a
pesquisa de Paulo Freire para a elaboração do construtivismo, para a elaboração
da alfabetização consciente de jovens e adultos, em que trás da própria
realidade destes aprendizes as palavras e todas as questões sociais a serem
propostas como textos e estudos em sala de aula, onde concluo com a frase do
mesmo educador: “Não basta saber ler que
Eva viu a uva. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu
contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse
trabalho.”
BOAL, Augusto. Teatro do
Oprimido e outras poéticas políticas. 6ªed. Rio de Janeiro, RJ: Civilização
Brasileira, 1991.
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